é mais tarde do que você imagina
“Aproveite. É mais tarde do que você imagina”
Essa frase me pegou desprevenido. Especialmente pelo tipo de filme que tava assistindo, uma mistura boba de ação, aventura e ficção científica. Mais ainda depois do fim de semana que tive, cheio de memórias da infância.
“Sabe porque você tem raiva do nosso pai? Porque é mais fácil sentir raiva que saudade.”
Essa doeu. Gratidão, saudade, dúvida, medo, tudo junto. Um coquetel emocional que me derrubou. Lutei contra. Fingi que não era nada.
Aceitei e chorei.
Me vi como uma versão alternativa do personagem que sentia raiva ao invés de saudade.
A simples diferença: no meu caso tem sido mais fácil “não sentir nada” do que sentir saudade.
Talvez algo parecido aconteça com você. Um sentimento esteja te protegendo de outro, mais profundo e mais difícil de lidar.
E isso foi um choque pra mim.
Quebrou boa parte da narrativa que uso pra dar sentido pros eventos da minha vida.
Se eu fosse usar uma palavra pra resumir a minha vida, eu escolheria a palavra liberdade.
Tive bastante liberdade para escolher como passar meu tempo na adolescência. Meus pais deixaram eu e meu irmão escolhermos a faculdade que queríamos, mesmo que isso fosse diferente do que eles gostavam. Mesmo que fosse em outra cidade. Ou estado. Também tive a liberdade de seguir a carreira que mais me interessava.
Pra lidar com a liberdade que meus pais me deram, eu resolvi criar meu próprio mundo desde muito cedo.
Me tornei empreendedor na faculdade lidar com isso tudo. E me tornei um grande defensor da liberdade no trabalho. Defensor da autonomia. Da proatividade. Da confiança. Também me tornei um crítico ferrenho da gestão por comando e controle.
Foi a minha forma de lidar com a a liberdade que recebi.
Mas essa mistura das frases provocativas do filme com lembranças latentes me fazer ver que tenho usado a prática de “dar liberdade” sem muito critério.
Em outras palavras, eu romantizei a liberdade pra poder lidar com ela. Eu idolatrava a liberdade para não lidar com a saudade ou com as complexidades da conexão.
Demorou, mas agora percebo que a liberdade, como tudo, não é um bem em si mesmo.
Depois desse evento me abri pra saudade que estava escondida em mim. Eu fui espontaneamente encontrar meu pai no trabalho dele. Disse que tava com saudade. Agradeci por tudo o que ele fez. Parei pra ouvir ele de um jeito que, sinceramente, eu não me lembro de ter feito nos últimos 15 anos.
Senti que me desamarrei das minhas próprias narrativas e me tornei, mesmo que por alguns minutos, uma pessoa mais real.
Foi um dos melhores dias da minha vida.
Dei um passo importante pra começar a quebrar uma lente que cultivei por anos e anos. Uma lente que colocava a liberdade acima da conexão. Uma lente que funciona muito bem pra evitar a escravidão, mas não tão bem assim para aceitar o amor.
E espero que eu consiga trazer algumas dessas lições para o meu dia a dia.
No trabalho, por exemplo, eu vejo que muitas vezes eu dei autonomia pra um time que precisava de apoio. Ou dei liberdade pra quem precisava de direção. Tudo isso “em nome da liberdade e autonomia”.
Eu errei. E provavelmente ainda vou errar com isso. Mas quero melhorar.
Hoje vejo que dar apoio não é cercear a liberdade do outro, mas se preocupar com o desenvolvimento do outro. Mais ainda. Dar apoio é dar um passo de coragem em busca da criação de conexão com o outro. A verdade que eu demorei para aceitar é que liberdade sem limites é abandono.
Liberdade é essencial, mas o que realmente vale a pena na vida é conexão. Pelo menos, essa é a lição que fica pra agora. É o sentido que dou pra tudo que tá acontecendo: defender a liberdade sem deixar de fomentar a conexão.
Mas a certeza é uma só.
Em breve a realidade vai me dar mais uma lição de que o sentido que dou pras coisas nem sempre é o sentido das coisas. E que manter a mente aberta é, talvez, seja o grande trunfo no jogo da vida.
Espero compartilhar as próximas lições aqui. E, se você gostou, compartilhe esse texto com alguém que precisa ler isso.
Vamu junto.