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“Sacrifício é tornar santo”.
Li essa frase em “A Coragem de Ser Imperfeito”, da Brene Brown, quando ela falava do sacrifício feito pelos pais na criação dos filhos. Na hora me veio a Mais Mu.
Por mais diferente que criar um negócio seja de criar um filho, alguns paralelos são possíveis.
O paralelo do sacrifício é um deles.
Eu tinha 21 anos quando comecei a Mais Mu com o Neto. Nessa época o meu trabalho ainda não tinha me feito acumular nenhum patrimonio. Tudo o que eu tinha eram economias de presentes de aniversário e natal, além de um dinheiro que ganhei dos meus pais quando entrei na faculdade.
Essas economias viraram a Mais Mu. O primeiro lote. A identidade visual. O coworking. Todos os gastos, que na época somavam algo perto de R$ 30 mil, vieram das minhas economias e do Neto.
Mas, quanto mais a Mais Mu crescia, mais a gente precisava de dinheiro. Estoque, contratação, escritório…
Crescer custa.
Não tinha muito caminho. Ou a gente pedia dinheiro, ou a gente deixava de crescer (ou existir). Por um tempo as nossas familias nos apoiaram financeiramente. Foram os nossos primeiros investidores anjo (tão anjos que o investimento foi quase todo na forma de doação).
Depois de um tempo isso se mostrou insustentável. Precisamos ir atrás de investidores anjo de verdade. Pessoas que nos dariam dinheiro em troca de participação na Mais Mu. Pessoas capazes de assinar um cheque maior.
Pro alivio do time (e das nossas famílias), levantamos nosso 1º cheque em 2019, quase 5 anos depois do nascimento da Mais Mu. Foram quase R$ 3 milhões.
Durante todo esse tempo, eu e o Neto trabalhamos sem receber nada. Zero de salário por 5 anos. Agora, com o caixa abastecido da captação, começamos a ganhar como estagiários. Depois de um tempo, como analístas. Sete anos depois, nosso salário se equiparou ao de alguns dos nossos gerentes.
Nossas famílias, sem dúvidas, se sacrificaram por nós. Nos deram parte de suas economias para que pudessemos seguir nossos sonhos. E nós nos sacrificamos pelo nosso sonho, trabalhando por anos sem receber nada, na espectativa que tudo isso “um dia ia virar”.
Tudo isso, sinceramente, é meio normal. Muito plantio para uma colheita tardia. Nada disso é uma exclusividade da história da Mais Mu.
O que chama a minha atenção (e que me fez escrever isso) é que nós, empreendedores, esperamos o mesmo tipo de sacrifício que tivemos para materializar o nosso sonho, de todos os membros do time. E isso, sinceramente, é impossível.
É como se os pais esperassem que os colegas de seus filhos fizessem os mesmos sacrifícios que eles, pais, fazem pelos filhos. O sacrifício, nesse sentido, é um privilégio dos pais. Digo privilégio porque, do mesmo jeito que há um grande esforço, há uma grande recompensa.
Esperar que o time se sacrifique como os fundadores é como esperar que os amigos dos seus filhos gostem deles simplesmente porque são seus filhos. Não importa o que o seu filho faça, os amiguinhos dele devem gostar dele. Isso é imaturo. O filho vai ter amigos se for um bom amigo. Por ser um companheiro, alguém digno de confiança, generoso. Não por ser seu filho.
Do mesmo jeito, o time vai gostar da empresa não porque ela é o xodó dos fundadores, mas porque ela é digna de confiança, generosa, amiga dos colaboradores…
No limite, o problema de tornar algo santo, seja um filho, filha ou empresa, é que deixamos de ver o lado real das coisas. Quando santificamos nossos filhos e filhas, deixamos de vê-los como seres humanos, que tem responsabilidades como tais. Colocamos eles em pedestais.
O mesmo acontece quando santificamos nosso negócio. Deixamos de ver a empresa como um grupo de pessoas que tem seus interesses individuais e vemos apenas como uma entidade abstrata que demanda sacrificio de todos.
No final das contas, me pergunto o que é sucesso em um sacrifício.
Depois de refletir sobre tudo isso, me parece que o sucesso do sacrifício não tem a ver com o nível de esforço envolvido no sacrifício, nem com o “santo” que nasce como resultado do outro lado. O sucesso do sacrifício é ter o nosso objeto de sacrifício (o nosso filho ou projeto) se tornar um bom amigo pros outros. Um amigo que ouve, te entende e tá junto pro que der e vier.
vaMU junto,